De eternos retornos e reencontros

Mais uma vez, uma vez mais. Com toda a imperfeição que caracteriza como humano, luto contra a inércia que me espera todos os dias, caprichosamente, no horário do treino. Porque canários o ciclo se repete como se vivêssemos um eterno Dia da Marmota. Substitua os bichos, coloque um pangaré e pronto: sou eu. Não importa se às 6 da manhã ou da tarde, nesse período de recomeço todo cuidado é pouco. Meia desculpa basta para trocar o treino de hoje por um chopp. Um cochilo. Um livro. Qualquer coisa.

Já falei algumas vezes aqui sobre disciplina e nem tenho a coragem de voltar no tema. É tão óbvio que chega a cansar. Mas, quando veste a carapuça da rotina, ela dá na nossa cara mesmo. Não é a constância e a firmeza de propósito que nos leva aos momentos dois de paus. Às vezes, nem objetivos são suficientes. Quando a leseira se instala, pode ser sinal que nem é hora de tentar. Pode ser que o momento seja de se esconder, se resguardar, planejar melhor o mental e tentar fortalecer a vontade para não falhar novamente.

Tem hora que cansa. Dói. Literalmente. Lesões? Platôs? Calor senegalês? Tô fora. Abro o Insta e dou de cara com vários corredores felizes, postando seus tempos de inspiração semi-olímpica. Heróis sem pátria, tudo o que fazem é aumentar o abismo das diferenças que, mesmo sem espelho, reconheço. Desculpem, em matéria de inspiração, vocês não estão me ajudando. Nada. Melhor ficar zen e tentar encontrar uma saída autônoma. Como diz uma certa música, cada um sabe a dor e a beleza de ser o que é.

Eu sei o que sou. Homem-pangaré, sujeito às intempéries do tempo, do meu corpo, dos corpos celestes, de tudo. Num mundo de eternas sincronicidades, todo o universo pode conspirar contra ou a favor de um simples ato. Correr ou não correr. Gostar e se sentir inteiro ou parecer um pedaço de uma poesia mal ajambrada. Se o ritmo ajuda, dançamos todos até o sol raiar. Se difícil não fosse, ninguém ficaria em casa. E os caminhos estariam sempre congestionados. Correr é para quem os quer livres. E a mente, livremente, espera sorrindo pelo instante da realização. Façamos então, nem que na marra, a sua vontade.