Legado Verde

O maior evento do mundo traz muitas oportunidades, mas também desafios para lidar com os impactos da vinda de milhares de visitantes e a complexa operação que envolve 65 competições, 29 dias e mais de 15 mil atletas, entre Olimpíadas e Paralimpíadas. Desde Londres, em 2012, a sustentabilidade passou a ser uma questão central no planejamento dos Jogos, não apenas em aspectos como economia de energia ou reciclagem de lixo, mas como indutora de transformações na sociedade em direção a um futuro mais responsável e equilibrado com as demandas do planeta. Conseguirá o Rio colocar isso em prática?

Atualmente, a lagoa Rodrigo de Freitas e a baía de Guanabara têm sido as vitrines sujas para o mundo, quando a questão é meio ambiente. A gerente geral de sustentabilidade do Comitê Rio 2016, Tânia Braga, admite que a qualidade das águas, de fato, está entre “os maiores desafios enfrentados”. E, definitivamente, perdido.

No entanto há muitas ações que, se de fato efetivadas, podem ser indutoras de transformações positivas para a cidade. “A estratégia foi integrar a sustentabilidade em todos os aspectos do planejamento dos Jogos. A responsabilidade ambiental, social e econômica deve estar presente em tudo e tem que durar”, afirma Tânia.

A maior parte do trabalho vem sendo feita na fase de preparação e será apenas monitorada durante os Jogos. Mas o planejamento e os primeiros resultados obtidos já garantiram ao Comitê a certificação ISO 20121, que atesta a gestão de eventos – é a mesma que os Jogos de Londres receberam, até então reconhecidos como os mais sustentáveis. Veja algumas das ações, em parcerias com diversas organizações:

– Com a Arca Brasil, Associação Humanitária de Proteção e Bem-Estar Animal, foi estabelecida uma cooperação para garantir a proteção dos animais abandonados encontrados nos locais de competição.

– A parceria com a Childhood Brasil é para combater a violação dos direitos de crianças e adolescentes, sobretudo a exploração sexual. “As ações abrangem a criação de um observatório e o engajamento da sociedade”, diz Rodrigo Santini, diretor-executivo.

– Com o WWF, entre 20 instituições, haverá apoio ao projeto Rio Alimentação Sustentável. Como serão muitas refeições, há um esforço para garantir que os alimentos nacionais sejam saudáveis, de origem ética, variados e acessíveis a todos, favorecendo pequenos produtores e o mercado local, inclusive de orgânicos. “A definição dos fornecedores está atrasada, mas estamos acompanhando para ver a efetividade dessas intenções”, avalia Eduardo Trevisan Gonçalves, secretário-executivo adjunto do Imaflora, que faz parte do projeto.

– Já com o público, o Comitê Organizador planeja engajar moradores e visitantes a cuidarem da cidade, promovendo o turismo responsável por meio da campanha Passaporte Verde, da ONU (passaporteverde.org.br). Estão programadas mobilizações sociais no Morro da Conceição e na zona portuária do Rio de Janeiro. “Faremos três intervenções urbanas nas quais a própria comunidade do entorno identificará as demandas nas quais ela tem interesse em trabalhar”, conta a gerente-geral de sustentabilidade.

– Outra ação será o tour no Campo Olímpico de Golfe, na Barra da Tijuca, para espectadores em dias de competição. Ao lado da lagoa e da área de preservação de Marapendi, o campo construído em uma área degradada por extração de areia já tem presenciado o aumento de vegetação e de animais na região. Após as Olimpíadas, o campo será de uso público, sem necessidade de associação.

Em paralelo, grandes marcas buscam vestuários e acessórios que aliem desempenho com baixo impacto ambiental. A Nike anunciou uniformes de atletismo com poliéster reciclado das garrafas PET. A Adidas já adota o esse mesmo tipo de tecido e desenvolveu um processo de tintura que não usa água.

Em busca do legado

No seu poder influenciador sobre vários setores da economia, o Comitê enxerga a grande contribuição dos Jogos para o futuro. Com a responsabilidade de compra e aluguel de 30 milhões de itens, foram estabelecidos para a área de suprimentos critérios de sustentabilidade como forma de induzir todas as cadeias de negócios. Produtos de origem florestal, por exemplo, deverão ter certificação FSC, ou seja, de móveis e papelarias às caixinhas das medalhas, nada virá de desmatamentos. A certificação também se estendeu à Casa da Moeda, que fará as medalhas e continuará adotando essa preocupação em seus outros produtos.

Com os hotéis do Rio, o trabalho tem sido de melhorar as condições de acessibilidade para deficientes físicos. Já com o Sebrae, a parceria envolveu a capacitação e certificação de micro e pequenas empresas de vários ramos – de gráficas a lavanderias – para se qualificarem como fornecedoras, ao melhorarem serviços e produtos.

E, diferentemente do que vemos hoje em relação a alguns estádios da Copa do Mundo, a organização tem afirmado que não haverá “elefantes brancos”. Uma das preocupações foi com as instalações temporárias, desenvolvidas sob o conceito de “arquitetura nômade”. A Arena do Futuro, por exemplo, onde acontecerão as provas de handebol, será desmontada e transformada em quatro escolas municipais.