No meio do caminho

Pronto, agora faltam 45 dias para a maratona. Chego a metade da preparação específica satisfeito com o progresso, embora atento aos perigos que sempre rondam quem se dispõe a realizar essa empreitada.

Ao mesmo tempo que escrevo sobre isso, posso imaginar as diversas reações dos leitores aqui do blog. Para quem está cansado de correr maratonas, já faz até ultras e quase nunca se lesionou, e também nascido no planeta Terra, vai achar que exagero. Já outros, no meio do caminho, podem mandar o clássico “pois é…”. No ponto oposto, quem continua – acertadamente – achando que maratona é um negócio assim do outro mundo, eu é que sou o alienígena.

No papel não parece tão difícil. É só conciliar o tempo, abrir mão de praticamente toda a vida social e seguir uma planilha com ou sem treinador. Ah, mas tem que fazer um treinamento de força, claro. E comer direito. Preciso de nutricionista? Ai acordei hoje com a panturrilha travada, como vou fazer o próximo treino? Estava precisando de uma massagem ou de uma sessão de fisioterapia. Tenho dinheiro? Dá para arcar com esse custo? 60, 70, 80 km por semana? Estou cansado de correr, fisica e mentalmente. Putz, acabou o GU!!!!

O quadro é típico – e é por isso que a grande maioria dos maratonistas amadores não faz disso um hábito. Durante a preparação você jura que nunca mais, que “só mais essa”. Mas depois, sabe-se lá o motivo, acaba se empolgando para fazer “a última”. Moro no Rio e nunca fiz a daqui? Check. Meu cunhado mora em Roma e me chamou para correr lá? Check. A equipe vai para Atenas ano que vem? Correr no percurso clássico? Não dá para perder? Check. Na empolgação, a gente esquece o sofrimento que é conciliar trabalho, lazer, família e demais compromissos para cumprir volumes quase profissionais pelas ruas. O trabalho, então, atrapalha demais, sempre digo isso. E a Megasena não ajuda.

É sempre bom colocar as coisas em perspectiva. Para mim, fazer tudo isso pela terceira vez é a prova concreta da insanidade gostosa que habita, secretamente, dentro de todo corredor. Chega a ser meio perverso, sabemos que vamos ter que fazer vários sacrifícios, mas aceitamos e ainda lutamos por tudo isso. Talvez por antever que o dia da prova simbolize uma catarse que tende a cobrir todos os perrengues com o doce gosto da vitória. Talvez ainda por vivermos num mundo onde o medo é tão presente em nosso cotidiano, que precisamos superar grandes desafios para nos provar que somos, sim, fortes. E que sempre que precisarmos, nosso lado maratonista nos tornará grandes.