Pé na lama

As corridas em trilha, modalidade conhecida como “trail run”, deixaram de ser um nicho e se tornaram uma realidade em todo o território brasileiro. Basta uma olhada no calendário nacional para comprovar: existem provas para todos os gostos e gêneros. E, ao se tornar uma modalidade cada vez mais acessível, ela ganhou espaço entre os corredores de rua que, cansados de participar de provas em percursos repetitivos, acabaram migrando para a terra.

A transição do asfalto para a trilha pode ser algo muito prazeroso, mas também muito traumático caso esse processo seja feito sem um planejamento adequado. Diferentemente da escola europeia ou norte-americana em que os corredores de trilha (os trail runners) já começam na montanha, os nossos estão indo do asfalto para a terra.

A idade média do corredor de trilha brasileiro é de 32 anos, ou seja, são corredores que têm experiência em corridas de rua. Se por um lado essa “bagagem” ajuda no condicionamento físico e mental, pode também atrapalhar na hora de fazer os ajustes necessários na transição do asfalto para a montanha.

Nos últimos cinco anos, tenho trabalhado com muitos corredores que estão nessa transição. Convivo com atletas com tempos expressivos em provas de rua que migraram para a montanha com a falsa impressão de que poderiam ter o mesmo desempenho e se decepcionaram, assim como atletas com marcas bem modestas na rua e que obtiveram muito sucesso nas trilhas.

Um dos ajustes mais importantes na fase inicial é a introdução de exercícios funcionais de fortalecimento, equilíbrio e propriocepção (percepção do corpo no espaço) à rotina semanal de treinamento. Também são essenciais a adaptação ao calçado específico para trilhas e o ajuste nos ritmos de treinos em terrenos irregulares – que devem ser mais leves que aqueles realizados no asfalto.

Outro fator determinante é a escolha das provas. Nas corridas em trilha, uma competição deve ser avaliada tanto na vertical como na horizontal. Sim, isso mesmo: uma prova de 10 km ou 21 km não pode ser estudada somente por sua distância horizontal, mas tem que ser levado em conta o desnível acumulado positivo e negativo – a chamada altimetria.

Esse total é a soma de quanto o atleta irá subir e descer durante uma prova de trail, tendo como referência os pontos de largada e chegada. Ou seja: quanto maior for o desnível acumulado, maior será o nível de esforço durante a prova.

Agora que você decidiu trocar o asfalto pela terra, contratou uma assessoria esportiva ou treinador, ou resolveu se jogar nas trilhas com os amigos mais experientes, faça sua transição de forma gradual e escolha a prova que se encaixa em seu perfil. E seja bem-vindo à corrida off-road!