Quer emagrecer?

Por Patricia Julianelli, colunista e redatora-chefe da Runner’s World Brasil

Já empurrei o prato porque pedi “ao ponto para mal” e a carne veio bem passada. Mas, hoje, o que tem tirado meu apetite não é o tratamento dado à carne na cozinha, mas, sim, o dado aos animais, do parto ao abate. Eu até tolero o fato de o ser humano matar outras espécies criadas para servirem de alimento. Mas os rituais de crueldade embutidos nesse processo são de revirar o estômago.

Por que teríamos o direito de torturar milhões de bichos? Os frangos de corte, por exemplo, passam seus 42 dias de vida em galpões (no Brasil, com ventilação e luz natural nas laterais) e mal conseguem se mexer: são cerca de 20 aves por metro quadrado. Não ciscam, vão contra a natureza. As chamadas galinhas poedeiras ficam literalmente sem chão. Imagine a cena: em uma gaiola de uns 50 cm x 50 cm, ficam sete galinhas espremidas. Tão espremidasque não alcançam o chão. Os ovos vão direto para uma caneleta. Também vão contra a natureza: não chocam. As pontas dos bicos são cortadas para que não destruam os próprios ovos, e elas são submetidas constantemente à luz artificialpara produzirem mais. Vivem estressadas, sem diferenciar o dia da noite.

As porcas ficam confinadas em minúsculas celas individuais. Resultado: ossos fracos, infecções de urina e doenças respiratórias causadas pelo xixi e cocô que ficam embaixo de um corpo que não se mexe por falta de espaço. Que mal se levanta. Elas são inseminadas artificialmente e, depois de quatro meses de gestação, vão para celas ainda menores para amamentar. O leitão, assim que nasce, tem as presas arrancadas (para não machucar a mãe ou outros filhotes) e, após alguns dias, tem a ponta do rabo cortada por um alicate, um soldador elétrico ou uma espécie de tesoura. A ferramenta fica a critério do algoz. E são, então, confinados até o abate.

Nesse contexto, os bois são “privilegiados”: no Brasil, só 6% são confinados e não pastam. Já as vacas leiteiras são inseminadas e constantemente ordenhadas por máquinas que causam inflamação e dor. Os filhotes machos são mortos ou criados em cubículos e com uma dieta pobre em ferro: tudo para que seja servida a carne de vitela, macia e clara (ou melhor, anêmica). Nem os peixes estão livres do estresse inerente à superpopulação: muitas espécies são criadas em tanques com espaços exíguos.

As empresas de orgânicos proporcionam uma vida melhor aos animais. Frangos passam parte do dia soltos, ciscam, e galinhas poedeiras fazem seus ninhos.O salmão, por exemplo, é criado com o dobro de espaço. Elas também são mais rígidas em relação ao abate humanitário, em que a ideia é causar o mínimo de estresse e dor ao animal, desde o transporte até a insensibilização (perda de consciência) antes do abate. Sim, inúmeras empresas tradicionais, especialmente as maiores, já seguem esses novos padrões, mas estamos falando do Brasil, imenso e desigual. E em parte dele o abate ainda é sinônimo de agonia, tortura e crueldade, de animais mortos a marretadas ou escaldados ainda vivos.

Não sei quanto a você, mas, para mim, a verdade por trás do filé suculento está cada vez mais difícil de digerir.