Pensar pra correr ou correr pra pensar?

É preciso deixar o cérebro tranquilo para correr bem

No quê você pensa quando está correndo? No trabalho? Na próxima prova que vai fazer? Nos km que ainda tem a percorrer? Naquele cara que você está a fim? Ou não pensa em nada, entra em estado de meditação?

Eu, por exemplo, pensei em escrever sobre este tema. Mentira, eu não estava correndo, estava nadando. Mas é a mesma coisa!

Como assim a mesma coisa? Isso mesmo, tanto a natação quanto a corrida são movimentos que, em neurologia, chamamos de automáticos. Os movimentos automáticos são aqueles em que o início é determinado por um comando voluntário, do cérebro. – Vou correr – A partir deste ponto, o movimento ocorre automaticamente, sem a interferência voluntária, e o cérebro está livre para fazer outras coisas, como pensar com que roupa você irá à festa de casamento do fim de semana.

O comando voluntário do cérebro só volta a atuar na corrida quando for necessário mudar o padrão. Quando você precisa desviar de alguém, pular um buraco, aumentar ou diminuir o ritmo ou na hora de parar. Enquanto o movimento se mantém sem alterações, o cérebro não participa mais, deixando que o controle dos movimentos do corpo seja feito por outra estrutura do sistema nervoso, a medula. E a medula tem funcionamento involuntário. Não depende da sua atenção pra te manter correndo. E talvez por isso a corrida seja tão viciante. É um momento em que você deixa seu corpo trabalhando em off-line, produzindo endorfinas e você pode curtir o barato.

Para entender melhor isso, veja o exemplo do funcionamento do meu computador enquanto escrevo.
2016-08-30

Eu havia dado um comando voluntário pro meu computador abrir dois aplicativos, o site da Runner’s e o editor de texto, como pode ser visto no gerenciador de tarefas. Mas se abrirmos a aba “Processos” do gerenciador de tarefas, vai aparecer uma porção de arquivos que estão rodando em segundo plano para que estes dois aplicativos funcionem.

É exatamente isso que acontece quando você corre. Você abre o aplicativo “Corrida” e sua medula trabalha em segundo plano para suas pernas fazerem movimentos rítmicos e alternados que te levam à frente.

Tá bom. Mas o que isso tem a ver com o tema deste blog (em busca da corrida perfeita)? A mensagem aqui é, se o cérebro não controla os movimentos da corrida, não é ele quem vai corrigi-los.

Se você abrir muitos aplicativos, o computador pode travar, não é? Na corrida é a mesma coisa. Não abra muitos aplicativos que trava. Quando estiver correndo, não pense em elevar o joelho, em mover os braços, em fazer uma pisada com a ponta dos pés ou com o calcanhar, vai dar errado.

A corrida exige a abertura de apenas dois aplicativos no cérebro: sustentação e propulsão. Então, para correr com eficiência, só pense em Crescer e empurrar o corpo à frente. Deixe o resto por conta da medula. E, nas próximas oportunidades, podemos discutir como fazer a medula rodar arquivos em segundo plano que façam a corrida ser perfeita!

Até lá. Cresce!

CassioCássio Siqueira é supervisor de fisioterapia do esporte do curso de fisioterapia da USP e fisioterapeuta da Care Club, onde trabalha com reeducação funcional de corredores. É formado em fisioterapia na USP, com especialização em fisioterapia no esporte e fisioterapia em neurologia, mestre e doutorando em ciências da reabilitação também pela USP.