O gosto das pequenas coisas

Finalmente, depois de quatro meses de muitas dúvidas, tentativas frustradas e alguns diagnósticos, estou voltando a correr. E é uma sensação incrível! Parece idiota falar isso num blog de corrida, mas, sob o risco de parecer mais que óbvio, não nos damos conta do que significa abraçar esse esporte e torná-lo tão importante em nossas vidas.

Estamos sempre mega preocupados com o próximo treino. Sofremos com isso, sobejados pela “certeza” de que existe um jeito correto e outro errado de fazer as coisas. Se o treino não encaixa, é o fim. Se vai tudo bem, sempre poderia ser melhor. Perder um treino é motivo de autoflagelação, pura e simples. Nossa, como somos chatos! Conheço muito corredor que se cobra como se fosse um profissional e de uma maneira que acaba irritando a todos ao redor. Nada contra se cobrar, muito pelo contrário, acho que boa parte da motivação vem por aí; mas calma, gente. Menos.

Em mais um dos meus infinitos retornos ao esporte, me percebo com o olhar do iniciante e isso é um barato! Perceber a cidade, os habitantes, as fachadas de prédios e casas, os bichos, enfim, todos os pequenos inputs cotidianos que na prática passam batidos pela maioria dos mortais. Mas não por nós, corredores. Uma das coisas bacanas de praticar esse esporte é apurar o olhar sobre o mundo e ressignificar banalidades, glorificá-las. Além disso, quer maneira melhor de entender o que se passa em nossa própria mente? Todo mundo já resolveu problema de trabalho, desenrolou a vida amorosa, encontrou mais razões para acordar no dia seguinte. Uma passada depois da outra.

Correr tira o véu cinza que encobre todas as dificuldades. Faz a gente acreditar que é possível ser feliz e que existe mágica nas nossas rotinas. Salva. Redime. Tem um poder tão maravilhoso que é absurdamente tosco olharmos só a pontinha do iceberg. Que todos possam mergulhar e encontrar os muitos sentidos escondidos.