Mulher com artrite reumatoide volta a correr pela mãe com câncer

Por João Ortega, Da Runner's World

Foto: Alexandre Gennari

A forma como cada pessoa escolhe encarar os desafios que a vida proporciona é decisiva para o bem-estar dela e dos outros à sua volta. A paulistana Fernanda Granato, que sofre com artrite reumatoide, é um exemplo de que, com mentalidade positiva e a motivação certa, é possível superar até os obstáculos mais árduos.

Aos 32 anos de idade, ela se mudou com o marido para a Alemanha, por conta de uma proposta de emprego. Sem praticar atividade física e pouco adaptada à vida no exterior, Fernanda começou a sentir desconforto e inchaço nos membros. “Não conseguia abrir as mãos”, lembra. Aos poucos, o desconforto evoluiu para dor, os inchaços aumentaram e os dedos das mãos e dos pés ficaram tortos. Os médicos alemães não deram um diagnóstico conclusivo, e a paulistana decidiu retornar ao Brasil para fazer exames.

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A conclusão de um reumatologista foi que ela apresentava uma doença crônica e autoimune chamada artrite reumatoide. Sem causas definidas, a doença tem incidência maior em mulheres e tende a se manifestar entre os 30 e 50 anos de idade, como foi o caso de Fernanda. O mal afeta as articulações em geral, com maior efeito nas mãos e nos pés.

Desde o diagnóstico, Fernanda faz tratamento no SUS e já realizou quatro cirurgias, buscando maior qualidade de vida através da independência dos seus movimentos – e, claro, para diminuir a dor.

Amor filial

Da época que se mudou para a Alemanha até o início do ano passado, Fernanda não se motivou a voltar a fazer esportes. Na verdade, o tratamento da artrite reumatoide, aliado ao cuidado do casal de filhos gêmeos, que nasceram em 2009, ocupava todas as posições da sua lista de prioridades. Foram quase 14 anos sem realizar atividades físicas.

Isso não significa que ela sempre tenha sido sedentária. “Na adolescência, eu era ginasta olímpica”, revela Fernanda. “Adorava correr! Nunca na esteira, porque sempre gostei de ar livre.” Inclusive já havia até corrido provas de 5 km.

Naquele momento da sua vida jovem, a corrida ainda significava apenas uma atividade para melhorar o físico e sentir prazer. Em junho de 2018, porém, surgiu uma nova relação com o esporte. Agora, cada passo vem com uma dedicatória.

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Em dezembro de 2017, Diana, mãe de Fernanda, foi diagnosticada com câncer, já em fase de metástase. “Vendo minha mãe o dia todo deitada, indo da cama para o sofá, me fez perceber que a doença que eu tenho, comparada a isso, não é nada”, relata a paulistana. Voltar a correr foi um gesto que, além de trazer inúmeros benefícios físicos e mentais para Fernanda, se tornou uma forma de dar força e energia positiva à Diana.

Mulher com artrite reumatoide corre para incentivar pais
Foto: Alexandre Gennari

“Resolvi que iria fazer algo que dependesse exclusivamente do meu esforço, da minha dedicação, mesmo se sentisse dor. E dedicaria à minha mãe cada volta, cada quilômetro”, explica Fernanda. “Nunca duvidei que iria conseguir porque sei o quanto sou determinada. Em junho, dei apenas uma volta inteira no parque trotando bem devagar. No total, consegui correr 1,2 km. Hoje já participo de provas.”

Quando a dor aparece

Mulher com artrite reumatoide corre para incentivar pais
Foto: Alexandre Gennari

Quando a dor da artrite reumatoide vem, Fernanda usa truques psicológicos para evitá-la. Se ela vem na perna, começa a focar nos movimentos dos braços. E se aparece nos braços também, foca nos próprios pensamentos ou na música que sai dos fones de ouvido. “Gosto de ouvir Freddy Mercury enquanto corro, me traz sentimentos de superação misturados com tristeza. Lembra a minha mãe e a minha infância. A corrida me ajuda a me lembrar dela. Às vezes até choro. Eu não gosto, porque quero me mostrar forte para minha mãe. Tem dias que sou um leão, mas não dá para ser leão todos os dias”, confessa.

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A corrida ressurgiu na vida de Fernanda como uma forma de mostrar à mãe que é possível vencer desafios. Entretanto os benefícios que a atividade traz a quem pratica vieram como “bônus”. “Com o esporte, meu emocional mudou, e eu diminuí os remédios. Minha cabeça é muito agitada, fico com muita energia acumulada, e a corrida me ajudou nisso. É uma terapia. Eu penso em tudo, e por isso gosto de correr sozinha”, conta.

A prática vem trazendo equilíbrio para seu corpo. Mais do que nunca, ela consegue desempenhar todas as atividades do dia a dia superando os incômodos por conta da artrite reumatoide. Além disso, Fernanda emagreceu cerca de 8 kg desde que voltou a correr.

Em setembro de 2018, porém, veio mais um baque: dessa vez, foi o pai, Lídio, quem recebeu um diagnóstico de câncer. Não tão avançado quanto o de Diana, mas deu à Fernanda uma motivação ainda maior para aumentar a demonstração de força e de coragem que vinha tendo. Por isso definiu uma meta ousada: correr a Meia Maratona de São Paulo, em outubro deste ano.

Mulher com artrite reumatoide
Foto: Alexandre Gennari

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Para alcançar esse objetivo, a paulistana de 46 anos sabe que precisará, além de toda a sua determinação, de uma mão de quem entende de corrida. “Eu me toquei de que preciso levar o que estou fazendo mais a sério. Com a ajuda de uma assessoria esportiva, quero ter maior consciência corporal, aperfeiçoar minha técnica na corrida e evitar me machucar por conta do meu pé deficiente”, explica.

Todos esses esforços dedicados aos pais são uma retribuição a tudo o que eles já fizeram por ela. E Fernanda não tem pretensões além do que sua energia que vem da corrida.

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Após a publicação dessa entrevista na ed. 120 da Runner’s World Brasil, a mãe de Fernanda Granato veio a falecer. Nossos sentimentos à família.

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