Na correria do cotiano, muitas vezes ficamos com pouco tempo para treinar. Veja algumas dicas de como incluir treinos de qualidade na sua agenda lotada.
Por Erin Strout
Faltando horas para chegar em Albuquerque, Novo México (EUA), no training camp intensivo em alta altitude da equipe de atletas Brooks Beasts, estou em um ônibus com mais 40 corredores.
Estamos rumo à pista de corrida da Universidade do Novo México, e estou animada e um pouco ansiosa.
Eu venho postergando meus treinos há meses por causa de um projeto pessoal. Mas, mesmo não estando na minha melhor forma, me sinto ansiosa para passar três dias focada em corrida, alimentação e sono. Assim como fazem os atletas profissionais no período de treinos em regiões elevadas.
Sob orientação do técnico Danny Mackey, os atletas da equipe Beasts ficam seis semanas em Albuquerque para se prepararem para a temporada de corrida em pista ao ar livre.
Passar um tempo em alta altitude é uma maneira natural de aumentar a EPO, hormônio que estimula a produção de hemácias, e a hemoglobina, que transporta oxigênio para os músculos. Os ganhos de adaptação são maiores em altitudes entre 2.200m e 2.500m.
Entretanto, a baixa disponibilidade de oxigênio em tais altitudes dificulta a corrida de alta intensidade. Por isso, a equipe Beasts faz um meio-termo: o espaçoso chalé da equipe está a cerca de 2.100m de altitude. Ou seja, aproximadamente 600m mais alto que Albuquerque, onde é feita a maioria dos treinos.
Uma estadia de três dias não é tempo suficiente para colher benefícios de correr na altitude. Mas, há outros objetivos nesses “retiros”.
“Eu aprendo muito com meus colegas de equipe só de observá-los no training camp. O que eles comem, que tipo de exercício preventivo realizam, o que fazem quando não estão correndo”, conta Katie Mackey, que venceu o campeonato de uma milha (1,6 km) dos Estados Unidos em 2017.
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Durante o primeiro intervalado, identifiquei uma pessoa que tinha um ritmo parecido com o meu. Ficamos juntos e demos força um ao outro durante o treino – repetições cronometradas em ritmo confortavelmente difícil –, que era muito desafiador em um calor de mais de 32°C em altitude elevada.
Juntos trotamos por algumas voltas para desaquecer, conversando, e eu me lembrei do motivo pelo qual a corrida tem um papel tão crucial para o meu bem-estar: é uma maneira de eu estabelecer laços de amizade e sentir aquela sensação de dever cumprido que temos quando concluímos algo difícil.
É claro que eu poderia ter percebido isso em casa se tivesse achado tempo para focar na corrida. Veja a seguir algumas das principais lições que aprendi no training camp e como você pode aplicá-las no seu treino.
Dicas para quem tem pouco tempo para treinar
Sintonize-se com o seu corpo
Se você olhar ao seu redor imediatamente após uma corrida com os atletas do Beasts, verá que está faltando alguma coisa: celulares.
A equipe tem uma regra: nada de telas por pelo menos 30 minutos depois da corrida. E o fato de o wi-fi funcionar muito mal na casa ajuda. Essa meia hora em que os corredores refletem sobre como se sentiram é considerada parte do treino.
Como diz o técnico Danny, nós prestamos menos atenção à nossa realidade quando estamos constantemente monitorando a das outras pessoas. Focar nos altos e baixos do treino ajuda os atletas a comemorarem conquistas, aprenderem com erros e identificarem padrões.
Se você não pode dispor de meia hora, use apenas alguns minutos, após a corrida, para anotar o que fez e como foi. Com o tempo, você vai perceber tendências importantes, por exemplo, uma lesão que só aparece durante corridas em ritmo mais rápido que 5 km.
Faça um esforço por cinco minutos
Todo corredor tem uma lista mental de atividades “extras” que deveria fazer (uso do rolo de espuma, musculação, meditação). Mas a vida costuma deixar pouco espaço para se fazer alguma coisa além do essencial.
Em vez de tentar encaixar tudo, escolha apenas uma atividade para fazer a cada dia (ou algumas vezes por semana), além de correr.
Para criar um hábito, relacione essa atividade a algum momento do seu dia. Experimente meditar por cinco minutos logo após o café da manhã, fazer algumas séries de agachamento e avanço assim que chegar do trabalho ou usar o rolo de espuma em pontos de tensão logo depois de colocar o pijama.
Em Albuquerque, os principais exercícios para o core dos Beasts são feitos em apenas 15 minutos.
Beba, coma, seja feliz
Em nossa última noite no training camp, fomos à casa dos Beasts para preparar um jantar ao ar livre, enquanto admirávamos o pôr do sol.
Embora esses atletas prestem atenção aos nutrientes que consomem para repor as energias, eles não se privam. Beber um pouco e comer uns nachos nesse ponto do treino não vai prejudicar o seu desempenho durante a temporada de competições.
Danny quer que os atletas aproveitem a vida e evitem ser rígidos demais. Por quê? Porque a corrida deve ser divertida, tanto para corredores amadores como para profissionais.
Kyle Pfaffenbach, consultor em nutrição do Beasts, diz que todos os corredores têm hábitos alimentares singulares. E ele trabalha conforme as necessidades e preferências de cada um, desde que isso seja razoável.
Se você consumir alimentos nutritivos, integrais, na maior parte do tempo e encher a maior parte do seu prato com vegetais, tanto no almoço quanto no jantar, você pode fazer algumas extravagâncias alimentares ocasionais, como beber tequila, se gostar.
Monte sua equipe
Passe algum tempo com os Beasts e vai ficar claro que eles são mais que um grupo de treino: eles formam uma equipe.
Eles fazem brincadeiras e sabem das peculiaridades de cada um. Como a paixão por comédias românticas de Brannon Kidder, corredor de 800m. Ou ainda as impressionantes habilidades culinárias de Izaic York, especialista em provas de 1.500m.
“Observou-se, em outras profissões, que um dos mais altos indicadores de sucesso é a capacidade de ter empatia”, afirma Katie.
“O training camp nos dá uma base sólida quando estamos na época das competições, pois estivemos juntos nas ‘trincheiras’. Temos empatia uns com os outros e conseguimos nos apoiar mutuamente.”
Eu percebo isso durante o primeiro treino em pista, quando nós, visitantes, somos separados em times e os atletas profissionais são nossos técnicos.
Meu pequeno grupo faz a rotina de aquecimento pré-treino dos Beasts e vai para a pista, com outros grupos torcendo por nós.
Dado meu nível de condicionamento físico, eu deveria estar sofrendo, mas o treino passa voando. Qual é a lição que fica disso? Procure pessoas onde você mora, desafiem e apoiem uns aos outros e veja sua diversão aumentar conforme seu tempo diminui.