Muito além da pisada

Para correr melhor, você precisa olhar para o corpo como um todo, e não só para os pés

Ilustração: Doug Lira.

Por Renan Malvestio*

Você já deve ter ouvido o conselho: “Faça um teste para descobrir seu tipo de pisada antes de comprar um tênis”. E várias clínicas oferecem aparelhos que revelam se sua pisada é neutra, pronada (“para dentro”) ou supinada (“para fora”). Há ainda avaliações, como a baropodometria, que medem a distribuição do impacto de cada passada pelo pé e possibilitam a produção de palmilhas sob medida. Se seu pé “desaba” demais para dentro, por exemplo, a palmilha teria um material mais rígido na parte interna. Mas esses cuidados são suficientes para prevenir lesões e melhorar o desempenho?

Na minha opinião, não. Um desvio de pisada (como uma pronação severa) ou uma distribuição de carga específica no pé podem ter origens completamente diferentes, porque são resultado de toda a organização do movimento do atleta. Nosso controle da postura (principalmente do tronco e quadris) interfere diretamente na acomodação dos pés no chão e, portanto, na pisada. Não é raro encontrarmos atletas pronadores que relatam até mesmo piora nos quadros de dor com o uso de tênis ou palmilhas que geram correção. Isso acontece porque, dependendo do movimento que origina aquele desvio, a correção no pé potencializa ou atrapalha outros ajustes que acontecem no resto do movimento.

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Em busca da corrida perfeita

O mesmo raciocínio se aplica a condições clínicas do pé. Uma rigidez ou um excesso de mobilidade patológicos, por exemplo, vão interferir no resultado que um tênis ou uma palmilha trarão e requerem uma avaliação médica.

A literatura científica é bastante ampla nesse assunto e mostra que o que mais importa no momento da escolha de um tênis é que ele seja simplesmente confortável. Não se encontra uma relação definitiva entre tênis com correção de pisada e menor incidência de lesões justamente porque essa correção vai muito além do pé.

O que fazer então? Ao comprar um tênis, busque conforto. No máximo, converse com seu treinador sobre características como peso e necessidade de maior estrutura no tênis dependendo da sua condição física e nível de performance. A partir daí, o importante é entender como você executa o movimento de corrida – não somente sua pisada, mas o gesto esportivo como um todo. Assim, um profissional especializado saberá identificar o que deve ser corrigido e como atuar.

Nessa avaliação ou durante um processo de correção, se for identificado que a dinâmica do pé é um limitador, aí, sim, uma palmilha ou um tipo de tênis específico podem ser bastante úteis, seja definitivamente ou, na melhor das opções, até você alcançar as condições necessárias para usar um tênis neutro.

*Fisioterapeuta da Care Club

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