Pai de portador de doença congênita conta história de superação do filho

Por João Ortega da Runner´s World Brasil

Foto: Alexandre Gennari

Todas as vezes que se aproxima da linha de chegada de uma corrida, Pedro Rodrigues agradece por cada um de seus passos longos e rápidos. O coach de carreira de 44 anos presta atenção em todos os movimentos e sensações do seu corpo; desde o contato dos pés com o chão. Os braços indo e vindo ao lado do tronco. O suor que escorre pelo rosto e até a leve dor no abdômen, já fatigado dos quase 21 km que ficaram para trás. À frente,
vê que seu filho, Theo; portador de uma doença congênita, ao lado da esposa Luciane, o espera para comemorar mais uma prova completa. Nesses momentos, Pedro nunca consegue conter a emoção.

Foi Theo quem lhe inspirou a valorizar todas as partes do seu corpo, todos os gestos dos seus membros. “Ele me ensinou a dar valor para cada centímetro de mim, até a meu dedo mindinho”, diz Pedro. Aos 10 anos de idade, Theo vive a vida com cada vez mais independência e tem um laço forte com o esporte. Chega a ser difícil imaginar que, antes mesmo de nascer, o menino recebeu prognósticos de que nunca estaria apto a andar sem uma cadeira de rodas.

Do susto à esperança

Foi no quarto mês de gestação que o casal recebeu a notícia da equipe médica: o filho Theo iria nascer com espinha bífida. Essa é uma má formação pouco comum na coluna vertebral. “Para a gente, no início, foi um choque! O prognóstico é de uma lesão muito grave, em que a criança fica paralisada abaixo do local da lesão”, relata Pedro. “Foi tudo novo, nunca tínhamos ouvido falar da doença.”

A partir do momento em que receberam o diagnóstico, Pedro e Luciane buscaram especialistas na área para garantir a melhor qualidade de vida para o filho que, em breve, chegaria ao mundo. Os dois primeiros foram inflexíveis: Theo não iria andar. Recomendaram já procurar por cadeira de rodas adequada e pedir auxílio para a AACD, que ajuda crianças com deficiência física.

O terceiro, porém, deu esperança para um futuro mais independente ao filho. O neurocirurgião Sérgio Cavalheiro afirmou que, “com apoio incondicional dos pais, muita fisioterapia e força de vontade”, ele conseguiria andar. Foi tudo o que Pedro precisava ouvir.

“Cinco minutos depois do nascimento, Theo estava na sala de cirurgia”, conta o coach de carreiras, que nasceu em Amparo (SP) e mora em São Paulo há cerca de duas décadas. “Isso fez toda a diferença.” O dr. Cavalheiro foi o responsável por fechar a espinha do garoto, que já nos primeiros meses de vida se habituou a fazer fisioterapia e treinar os movimentos do corpo.

Portador de uma doença congênita, mas igual a todo mundo

Aos 10 anos de idade, Theo aprendeu a entender as particularidades do seu corpo. O garoto sabe que precisa se esforçar mais que os outros para realizar as atividades físicas do dia a dia. Mantém uma rotina que inclui fisioterapia, hidroterapia e passou por diversos tratamentos e até cirurgias durante a infância. Ainda assim, não se vê como excluído dos demais, possui amigos na escola e, com acompanhamento psicológico, não permite que suas dificuldades o deixem para trás.

“As crianças na escola às vezes perguntam por que ele usa a botinha [órtese], e ele explica tranquilamente que precisa daquela ferramenta para andar sem ajuda”, conta Pedro. “Mas nunca o veem como esquisito, como diferente.”

O desenvolvimento intelectual nunca foi prejudicado pela doença congênita. Theo não apresenta problemas para aprender e entender as lições do mundo. Apesar das limitações do seu corpo, o garoto adquiriu interesse em especial pelos esportes, também por conta da relação com o pai.

Corrida e outros esportes

Desde 2012, Pedro é um corredor assíduo. Na época, trabalhava no setor de recursos humanos de uma grande empresa do país. Ficou responsável por promover a participação dos funcionários na Corrida de Revezamento do Pão de Açúcar. “Nada mais justo, para dar o exemplo, que participar também”, conta. O pai de família foi atrás de assessoria de corrida, começou a treinar com os colegas de trabalho e, como ele mesmo diz, foi “mordido pela paixão ao esporte”.

A partir dali, o coach fez o caminho que é comum à maioria dos corredores. Passou por provas curtas. Preencheu sua rotina com treinos. Correu algumas meias maratonas … e agora se prepara para sua primeira maratona, a SP City, neste ano. E a energia para tudo isso ele tira da superação do filho.

“Assistimos juntos a jogos de futebol e de tênis. Ele também gosta bastante de corrida. Está bem ligado ao esporte”, conta Pedro. “Quando eu viajo para correr uma prova, ele e minha mulher me esperam na linha de chegada. Fico muito feliz, e ele sempre me elogia, diz que eu corro pra caramba.” Em algumas caminhadas leves, Theo anda ao lado do pai. Em outros treinos mais intensos, o corredor leva o filho em um carrinho adaptado, e assim podem compartilhar o esforço juntos.

Um bom futuro para Theo

Hoje Theo gosta de praticar capoeira, e os pais têm planos para inseri-lo em outros esportes num futuro próximo. Enquanto aguardam o aval dos médicos, Pedro e Luciane pesquisam esportes paralímpicos em que o filho possa se encaixar bem. Natação e lutas marciais surgem como os principais candidatos neste momento.

“O que me inspira é ver o esforço do Theo. Com toda a falta de mobilidade que ele tem, ele contrasta com muita gente que é 100% saudável e é sedentária por escolha”, confessa Pedro, com emoção na voz. “Hoje, com esportes paralímpicos, a gente vê muitos exemplos incríveis. Por que eu ficaria vendo televisão no sábado de manhã? É tão importante poder movimentar o corpo, não há motivos para desperdiçar esse privilégio.”

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