Quinze atletas e uma zebra

A etíope Almaz Ayana era favorita absoluta para levar o ouro. Já havia vencido os 10.000m na sexta passada, com direito a estraçalhar um recorde mundial que durava 23 anos e parecia, ao menos por ora, inalcançável. Este ano, Ayana já tinha corrido os 5.000m em 14’12", apenas um segundo abaixo do recorde mundial. E venceu com sobras sua bateria na semi-final olímpica (15’04", contra 15’17" da segunda colocada). Nem o queniano mais fanático diria que Ayana perderia o ouro. Num lampejo atrevido de otimismo, talvez cogitasse gargantear que Ayana , vá lá, não bateria o recorde mundial.

Os primeiros 2000m vieram em seis minutos cravados, puxados quase que integralmente pela japonesa Miyuki Uehara. Ritmo médio bem modorrento para Ayana, que já havia sido mais rápida em qualquer das duas metades da prova de 10.000m.

Até então, as 15 atletas estavam em fila indiana, sem grandes brechas. Ayana resolveu que era hora de parar com a caminhada geriátrica e começar a correr. Os 1.000m seguintes vieram em 2’47", com as quenianas ficando para trás. Depois, Ayana fez 2’52", mantendo as rivais cerca de 30m distante. Foi aí que abriram a porteira do estábulo do Engenhão e a zebra escapou para dentro da pista, levando Vivian Cheruiyot a galope. A queniana começou a acelerar e, aos poucos, foi diminuindo a distância. O jogo de equipe queniano, com as três atletas correndo em grupo praticamente a prova toda, foi fundamental. Não se desesperaram quando Ayana abriu vantagem, mantiveram-se juntas e aproveitaram as vantagens físicas e psicológicas de correr num pelotão.

Faltando duas voltas, Cheruiyot já havia encostado em Ayana, que, ultrapassada, foi ficando pelo caminho, sem esboçar grandes reações. O esforço do recorde mundial dos 10.000m uma semana antes e a estripulia de fazer, quatro dias depois, a semifinal num ritmo mais forte que o estritamente necessário para classificar mandavam a fatura. A sentada de bota entre os 2.000m e os 3.000m foi o último prego no caixão. Nas últimas duas voltas, Ayana não tinha pernas para reagir ao ataque queniano.

Ouro inédito, com direito a recorde olímpico, para Vivian Cheruiyot, que, na zona mista, esboçava um sorriso que contrastava com a cara amarrada da sexta-feira anterior, quando ficou com a prata dos 10.000m.

Ouro: Vivian Cheruiyot (QUE) 14:26.17 – novo recorde olímpico
Prata: Helen Obiri (QUE) 14:29.77
Bronze: Almaz Ayana (ETI) 14:33.59