Encontro com o divino

Existe um ditado que afirma que antes de uma tempestade, vem sempre uma calmaria. Se observarmos bem, isso é bastante palpável. É como se o mundo estivesse refletindo, se preparando para enfrentar os desafios que todo evento climático mais radical apresenta. Para mim, na corrida, essa fase é exatamente a que estou passando, a dias do início do meu treino para Nova Iorque.

Por mais que algumas pessoas lidem com uma maratona como se fosse a coisa mais tranquila do mundo, sinto exatamente o contrário. É estranho. Tenso. Sofrido. Claro que existe a glória ao final, acompanhada do novo rótulo que adquirimos: Maratonista, com o “M” maiúsculo mesmo. É bonito, impressiona e, socialmente, você começa a ser tratado como um ET. Mas do bem, não do tipo “Marte Ataca”, que sai fuzilando todo mundo.

Quando completei minha primeira maratona, em Amsterdam, me senti capaz de realizar qualquer coisa. A gente vira meio imbatível, ao menos energeticamente. É uma sensação tão especial que fica impossível descrever em palavras. Meio como se o céu e a terra se encontrassem e, bem no meio, você. Os meses de treinamento, ausência de vida social noturna, dieta, musculação, fisioterapia e estresse foram obliterados por uma força muito mais poderosa.

Tem gente que diz que a sensação é mística. E como não seria? Ao nos sentirmos reis e rainhas, alcançamos um estado quase divino. Nos aproximamos de algo maior, quase deuses no planeta corrida. Todo o tempo gasto no processo de se conquistar os 42K nos faz pessoas melhores. Dói, mas é essa dor que possibilita o crescimento. E a evolução, nesse mundo, se dá por aí. Ou por amor. E esse mesmo amor é que passa a ser mais intenso depois que nos percebemos como heróis de nossa própria história. Amor por tudo.

Está chegando a hora de trilhar esse caminho, com todas as suas dificuldades e recompensas. Em meio à ansiedade do início desta jornada, tenho hoje a consciência do que me espera. E, por isso, agradeço. Por todas as oportunidades que tive ao longo da minha vida e que me levaram a me tornar um corredor. Pela minha saúde, física, emocional e espiritual. Agradeço e aceito mais esta montanha para escalar. E com fé eu vou, pois ela não costuma falhar.